28 abril 2011

Poder e representação: teatrocracia em Moçambique (7)

O sétimo número da série, que no seu título usa um termo de Georges Balandier, teatrocracia.
Prossigo no terceiro ponto do sumário que vos propus, refiro-me ao poder comicial, agora escrevendo um pouco sobre a gestão da oratória.
Somos um país rico em oratória, em discursos, em palavras de comícios. Os comícios são, faz já muitos anos, um enorme viveiro discursivo, lá onde o líder - grande ou pequeno, em meio urbano ou rural, após um aparatosa chegada de carro, helicóptero ou avião, vindo da capital, da sede provincial ou da sede distrital - vai falar ao povo expectante e sedento de novidade. Palavras todos nós usamos, mas palavras para comícios são do uso exclusivo dos gestores do poder político e estatal, uso livre no caso do partido no poder, mediante autorização policial no caso da oposição. E são esses gestores da palavra comicial que, por tempo indeterminado, falam às populações (termo eufórico e despolitizador) sobre o que fizeram, sobre o que farão e sobre o que esperam o povo faça, são esses gestores que trazem a espectacularidade das promessas, o desenho axiomático de um futuro que só eles conhecem, o mundo que dizem novo no mastro das palavras veementes. Os comícios são um programa permanente de avaliação e controlo políticos e a discursividade age através de uma cadeia piramidal de chefes que se revezam em visitas de inspecção e mobilização política.
Imagem: el poder, quadro do pintor e ceramista argentino Raúl Pietranera).
(continua)

1 comentário:

Salvador Langa disse...

Brilhante, Professor.