25 julho 2008

Do poder dos universitários (5) (continua)

Vamos lá avançar um pouco mais nesta série.
Não importa em que área do saber científico, as universidades são templos profanos nos quais três fenómenos são profundamente produzidos e reproduzidos:
1. Regras de pesquisa e de exposição dos resultados
2. Combates pela aprimoração e pelo monopólio da verdade científica
3. Colecção de insígnias e de rituais destinados a manter e a demarcar a verdade dos cardeais do saber científico
Falei-vos um pouco do ponto 1.
Vamos agora ao ponto 2.
Na verdade, o que está em jogo é a verdade - a verdade profana, vitoriosa, empírica, replicável -, seja nas ciências duras (com os seus eixos na matemática, na física e na química), seja nas ciências moles (ciências sociais e humanidades).
Nas ciências duras, a busca da verdade é, quase sempre, acompanhada pela produção de algo que modifica a nossa vida. Pensem no celular, por exemplo, produto da tecnologia, produto da matemática e da física. Mas mais: as lutas de paradigmas não impedem que o celular seja universalmente aceite e tenha aplicabilidade social, sejam quais forem os seus modelos.
Nas ciências moles, a situação é distinta: as relações sociais não se tornaram mais justas, não foi ainda possível criar um ser humano diferente, mais solidário, mais ser humano, apesar da multiplicidade espantosa de trabalhos de pesquisa, designadamente em psicologia e sociologia. As intensas lutas de paradigmas não deram ainda origem a algo que seja socialmente diferente e para melhor. Nenhuma lei mudou o comportamento humano nesse sentido. Mais: a uniformidade nas regras e nos modelos de pesquisa, não converge sobre um modelo unívoco de interpretação e de resolução sociais. Por hipótese, quanto mais avançam as ciências duras, mais regridem as moles, apesar de todo o seu imenso aparato institucional e do esforço para estudar, classificar e mudar o comportamento social.
Em qualquer dos casos, a luta pela verdade científica (a luta sagrada por algo acima ou fora do chamado senso comum, do senso popular, das verdadezinhas comestíveis de rua) é permanente a todos os níveis. São lutas de templos, de capelas temáticas, de laboratórios, de oficiantes, de sacerdotes, de personalidades, de recursos de autoridade, de bíblias seculares, de textos sagrados dos sábiossauros, de textos malditos, de santas inquisições, de rituais severos de ascenção e avaliação, de prémios e de castigos, de infernos e de paraísos. Muito raramente ou muito dificilmente sabemos o que se passa nos subterrâneos pessoais dum laboratório, dum gabinete, dum trabalho de campo, dos bastidores dos seminários. O que aflora é, regra geral, o produto final - o artigo, o livro, as actas -, não a luta por baixo que até ele conduz, não a competição, não as quantas vezes terríveis disputas de poder, vaidade e ciúme.

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